terça-feira, 31 de maio de 2011




"Sinto saudades de tudo que marcou a minha vida. Quando vejo retratos, quando sinto cheiros, quando escuto uma voz, quando me lembro do passado, eu sinto saudades... Sinto saudades de amigos que nunca mais vi, de pessoas com quem não mais falei ou cruzei... Sinto saudades da minha infância, do meu primeiro amor, do meu segundo, do terceiro, do penúltimo e daqueles que ainda vou ter, se Deus quiser... Sinto saudades do presente, que não aproveitei de todo, lembrando do passado e apostando no futuro... Sinto saudades do futuro, que se idealizado, provavelmente não será do jeito que eu penso que vai ser... Sinto saudades de quem me deixou e de quem eu deixei! De quem disse que viria e nem apareceu; de quem apareceu correndo, sem me conhecer direito, de quem nunca vou ter a oportunidade de conhecer. Sinto saudades dos que se foram e de quem não me despedi direito! Daqueles que não tiveram como me dizer adeus; de gente que passou na calçada contrária da minha vida e que só enxerguei de vislumbre! Sinto saudades de coisas que tive e de outras que não tive mas quis muito ter! Sinto saudades de coisas que nem sei se existiram. Sinto saudades de coisas sérias, de coisas hilariantes, de casos, de experiências... Sinto saudades do cachorrinho que eu tive um dia e que me amava fielmente, como só os cães são capazes de fazer! Sinto saudades dos livros que li e que me fizeram viajar! Sinto saudades dos discos que ouvi e que me fizeram sonhar, Sinto saudades das coisas que vivi e das que deixei passar, sem curtir na totalidade. Quantas vezes tenho vontade de encontrar não sei o que... não sei onde... para resgatar alguma coisa que nem sei o que é e nem onde perdi... Vejo o mundo girando e penso que poderia estar sentindo saudades Em japonês, em russo, em italiano, em inglês... mas que minha saudade, por eu ter nascido no Brasil, só fala português, embora, lá no fundo, possa ser poliglota. Aliás, dizem que costuma-se usar sempre a língua pátria, espontaneamente quando estamos desesperados... para contar dinheiro... fazer amor... declarar sentimentos fortes... seja lá em que lugar do mundo estejamos.

Eu acredito que um simples "I miss you" ou seja lá como possamos traduzir saudade em outra língua, nunca terá a mesma força e significado da nossa palavrinha. Talvez não exprima corretamente a imensa falta que sentimos de coisas ou pessoas queridas. E é por isso que eu tenho mais saudades... Porque encontrei uma palavra para usar todas as vezes em que sinto este aperto no peito, meio nostálgico, meio gostoso, mas que funciona melhor do que um sinal vital quando se quer falar de vida e de sentimentos.

Ela é a prova inequívoca de que somos sensíveis! De que amamos muito o que tivemos e lamentamos as coisas boas que perdemos ao longo da nossa existência..."


Clarice Lispector

domingo, 29 de maio de 2011




Eu sei que por muitas vezes você perdeu o fôlego só por estar ao lado dele, e deseja impacientemente que a sua perda de fôlego hoje fosse pelo mesmo motivo, ao invés de ser pela falta que ele te faz. Eu sei que quando você olha para algum canto da sua casa em que ele esteve ou em que você esteve com ele, bate um aperto no peito. Eu sei que todas as vezes que o telefone toca perto das nove, você deseja que seja ele. Eu sei que em algumas noites você deseja com toda sua força que o sono venha, porque você não suporta mais pensar que não o verá no dia seguinte. Eu sei que você fica pensando naquele sorriso doce, que só ele tinha, no jeitinho que ele balançava o cabelo, e na forma toda desleixada dele andar. Eu sei que as vezes você se pega imaginando cenas onde você e ele estão juntos e felizes novamente. Eu sei o quanto você sente falta daquele abraço apertado, e também sei que você faria de tudo para sentir ele só mais uma vez. Sei que tem vezes que você fecha os olhos e parece que está beijando ele novamente, como se fosse a primeira vez. Eu sei MUITO bem o quanto você sente falta dos beijos dele. Sei de tudo isso e mais um pouco. Sei que você se preocupa com o jeito que sai de casa, porque sai pensando que por um deslize, você o encontre na rua. Sei que você é capaz de tudo pra ter ele de volta. Aqueles defeitos irritantes que só ele tinha, aquele jeito teimoso, e aquela mania de sempre querer te tirar do sério, eu sei da falta que isso faz. Eu sei que você revivi cenas, volta no tempo, deseja que teu passado se torne presente mais uma vez.E eu sei a dor que você sente quando descobre que seus planos de um futuro ao lado dele, não serão mais realizados. Eu sei o quanto as lembranças insistem em aparecer na sua mente. Eu sei cada detalhe, cada lugar, faz lembrar dele. Eu sei que você se proibiu de abrir aquela caixa com: bilhetes, papéis, cartas, fotos, enfim, memórias. Mas eu sei também que você acabou fazendo o contrário, que já se viu abrindo a tal caixa diversas vezes, e que ao fazer isso bateu uma saudade gritante no seu peito. Aquela música que ele cantou pra você, a mesma música que tocou na primeira vez que vocês se beijaram, a música que era só de vocês, eu sei que você se proibiu de escutá-la. Eu sei que em algum dia você sentiu no ar aquele perfume que só ele tinha, e que ficou olhando para os lados na esperança de vê-lo novamente. Eu sei a falta que você sente do cheirinho dele. Eu sei como você sente falta dos amassos no elevador, no sofá, no cinema […] e dos mil jeitos de esconder isso dos outros. Eu sei da confiança que você tinha nele. Sei das palavras de conforto que ele te dizia, que nem eram tão extraordinárias assim, mas que para você soavam como o melhor poema do mundo. Eu sei que você fica relembrando aquelas conversas, que até um tempo atrás pareciam ser tão inúteis, mas que hoje fazem muita falta. Sei da dor que você sente, só de imaginar, que ele pode estar sendo feliz com outra pessoa. Seja pela falta, pela dor, pelas lembranças, pelos sonhos, eu sei muito bem das lágrimas que você já chorou, e que infelizmente, ainda vai chorar.


 Fernanda Quartarolli

sexta-feira, 27 de maio de 2011

O que falta



"Todas as cartas de amor que hoje repousam em alguma gaveta velha e as que não foram nem escritas pelo medo da resposta. As rasgadas, queimadas, manchadas de água dos olhos ou caneta ruim. Todos os sentimentos ridículos que só são ridículos pelo tamanho da verdade, pela vontade de dizer sem motivo e mil vezes. Todas as ressacas desnecessárias das noites vazias, que seriam tão facilmente evitadas, que por pouco não são preenchidas de romance e música. Todas as palavras certas da pessoa errada e todas as pessoas erradas que insistem em tentar me fazer feliz quando são incapazes por natureza. Os risos forçados que geram lágrimas no travesseiro, as danças vazias que geram um vazio ainda maior. Os finais de semana que doem o resto dos dias. A mentira que preenche de ar o que devia ser companhia. A amargura que cresce rancor por coisas pequenas e afáveis dos que são capazes da felicidade.

É por isso e talvez por mais algumas coisas que não tem nada aqui dentro. Porque todo o sentimento que faz bem só existe pros outros, pros bonitos, pros inocentes, pros que se deixam levar e são felizes desse jeito. Eu não. Sou artista, sou mentira, sou intensidade. Não consigo aceitar pouco. Tem gente que vive de jogos porque rebaixa o amor à adrenalina, porque acha que o pressuposto dos relacionamentos é sofrer. Eu não sou assim. Não gosto de solidão a dois.

Eu tenho tentado, inutilmente, ser melhor. Me perdi no caminho e não posso voltar ao que era, tampouco posso parar de seguir em frente. Então deve haver uma maneira de evoluir sem perder o direito de sentir. Crescer sem perder a esperança nas pessoas. E aprender isso sozinha é triste: torna todo o resultado inútil."


Verônica Heiss



(...) Todas as vezes na vida que eu falei em absolutismos eu sabia que estava mentindo porque, pra mim, tudo sempre é imediato, porque eu não tenho a mínima paciência de não ser mimada... Mas sempre, sempre, cinco minutos depois, tudo passa. Nunca menos e raramente mais do que isso, cinco minutos, e tudo vai embora porque é assim, as coisas têm que passar, os dias têm que mudar, os ares têm de ser novos e a vida continua, com ou sem qualquer um.

Só que esse sempre foi e ainda é o seu problema. Não ser o um que não faz falta, não ser a noite perdida num canto de um balcão qualquer, não ser o beijo de hálito gelado, tesão quente e vontade limitada. O seu problema, é ser um problema sem solução. É ser vontade pra mais de anos, é ser virtude pra uma vida inteira, é ser idealizado porque há tanto tempo eu, você e o mundo que nos cerca, separados, esperamos tanto...

Pra mim, é dificil aceitar e entender que eu tentei te deixar pra trás, como todo o resto, mas não consegui. É dificil olhar os fatos, comprovar as dificuldades, ter preguiça, sentir cansaço, doer, arder, ferver e, mesmo assim, não conseguir te colocar dentro de um prazo. Seu prazo de validade não venceu em cinco minutos...”


Rani Ghazzaoui

quarta-feira, 25 de maio de 2011



"Sabe quando a gente era criança e acreditava em conto de fadas? Naquela fantasia de como seria a vida... Vestido branco, príncipe encantado, que levaria a gente para um castelo nas montanhas... Deitava na cama a noite, fechava os olhos e tinha a mais completa fé... Papai Noel, fada dos dentes, príncipe encantado... Eles pareciam tão reais que a gente quase tocava neles! Mas com o tempo a gente cresce, e um dia a gente abre os olhos e o conto de fadas já era. A maioria se apoia em coisas e pessoas das quais pode confiar. Mas o fato, é que é difícil se livrar do conto de fadas completamente, porque quase todos ainda tem aquela esperançazinha, aquela fé, de que algum dia, vão abrir os olhos e tudo vai virar realidade.
No fim do dia, a fé é uma coisa engraçada. Ela aparece quando você não a espera... É como se um dia você percebesse que o conto de fadas pode ser levemente diferente do que você sonhou. O castelo... bem, pode não ser bem um castelo. E não é tão importante que seja feliz depois de tudo, apenas que seja feliz agora. Veja, de vez em quando... muito raramente... as pessoas vão te surpreender. E de vez em quando... as pessoas vão tirar o seu fôlego."

Grey's Anatomy

segunda-feira, 23 de maio de 2011

36 prestações de saudade




"Dizem que tudo na vida tem dois lados. Um bom e outro ruim. Depende nos olhos de quem está a pimenta. Mas se tem algo realmente ambiguo para uma única alma é um troço chamado saudade. Com ou sem primenta nos olhos. O dito popular é quem melhor traduz a dualidade de uma saudade quando diz que esta é a maior prova de que o amor valeu a pena. Então sentir a falta é bom. E ruim. Em todos os pontos de vista. Vai entender...

Saudade é amar um passado que nos machuca no presente. É uma felicidade retardada. É deitar na rede e ficar lembrando das ardentes reconciliações depois de brigas homéricas por motivos desimportantes. Sente-se falta de detalhes, como uma toalha no chão, dias chuvosos, da cor dos olhos. A saudade só não mata porque tem o prazer da tortura.

Saudade é o amor que não foi embora ainda, embora o amado já o tenha feito. Ter saudade é imaginar onde deve estar agora, se ainda gosta de vinho bordeaux, se chorou com a derrota do Grêmio no campeonato nacional, se tem tratado aquela amigdalite. E quando a saudade não cabe mais no peito, se materializa e transborda pelos olhos.

Sentir saudade é ter a ausência sempre do seu lado. É mudar radicalmente a rotina, comer mais salada e menos sorvete, frequentar lugares esquisitos, ter dias mais compridos, ter tempo para os amigos, para o vizinho e para a iguana do vizinho. A saudade é a inconfortável expectativa de um reencontro.

Às vezes a saudade é tão grande que nem é mais um sentimento. A gente é saudade. É viver para encontrar o olhar da pessoa em cada improvável esquina, confundir cabelos, bocas e perfumes, sorrir com os lábios tendo o coração sufocado. Porque mesmo a saudade sendo feita para doer, às vezes percebemos que ela é o meio mais eficaz de enxergar o quanto amamos alguém, no passado ou no presente.

Por que a saudade é o muro de Berlim desmoronado no chão, capaz de agregar opostos, como a tristeza e a felicidade em uma coisa híbrida. Se você tem saudade é sinal que teve na vida momentos de alegria com ela ou ele! No fim das contas, a saudade que agora lhe maltrata nada mais é que uma dívida sendo paga em longas 36 prestações pelo amor usufruído. Agora aguenta..."


Gabito Nunes

Reflexões


Andei pensando. Fazia tempo que não começava um texto assim. Mas andei pensando. Por favor, não fique assustado. Sei que às vezes meus pensamentos são estapafúrdios e totalmente fora de propósito. Juro que me esforço.

Hoje acordei com uma energia boa. E olha que o dia tinha tudo pra ser um grande desastre. Amanheceu feio, tímido, chorando. Vejo um lado bonito na chuva, me traz uma melancolia boa, uma vontade de pensar sobre as coisas, uma vontade de fazer mais por mim, por você, por todo mundo.


Nossas escolhas estão bem aqui, no coração. Não pense que está no colo de um, na mão de outro. Não se adie, por favor. E não se entregue. Aconteça o que acontecer: não se entregue. Não mude seu jeito por ninguém. Mude suas caras, bocas e trejeitos se quiser. A gente é o que é e quem não gosta, paciência. Não se traia, não se mude, não se mova. Seja você.


Tenho gostado tanto de mim. Mesmo com minhas estranhezas e incertezas. Mesmo com meus medos - sou cheia deles, principalmente quando anoitece. Tenho medo. Do escuro, do desconhecido, do que não vejo. E tenho medo de ver o que não sei ainda. Parece papo de louco, eu sei. Mas você sabe? Sabe que existem muito mais coisas do que a gente pode ver, crer, tocar, sentir?

Quanto mais o tempo passa mais percebo que somos pequenos. Tão pouco. Temos tanto o que aprender, o que conhecer. E ao mesmo tempo ficamos estagnados, petrificados. O mundo não para de rodar, nos obriga a decidir, a partir, a ficar, a voltar. E ninguém pergunta o que você quer, como você se sente, o que pretende, o que sonha, se está feliz, satisfeito, se existe algum jeito. E tem. Tem muitos jeitos. Tem o seu jeito. E pra tudo tem remédio, saída, solução.


Reflita. Se perceba. Se decida. E procure ser feliz hoje. Buscar você mesmo em algum canto. E abraçar, beijar, seguir em frente sem olhar o que ficou.


Clarissa Corrêa

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Da falta de sorrisos


Sou sempre a pessoa que mais ri da turma, o sinônimo de alegria é o meu nome. Mas tem dias que os fatos me afetam e eu não sou só sorrisos, tem dias que a TPM ataca e eu não to pra ninguém. Tem dias que simplesmente eu não acordo de bom humor e aí o mundo inteiro põe para mandar eu colocar um sorriso na cara, como se existisse uma lei que diz que nenhuma pessoa pode acordar de mal humor.

Não vivo mandando ninguém desmanchar a tromba quando estão de mal humor, só fico esperando que não sobre pra mim. Eu tento não descontar o meu nos outros também, mas aí o mundo insiste, insiste, insiste e então consegue: ganha uma bela patada com direito a cavalinhos relinchando como plano de fundo da situação.

Não é obrigação minha, nem sua, nem do cara que vende pipoca, nem do cachorro, distribuir simpatia o dia todo, todo dia. Nem o Sol quer sorrir e se mostrar todo dia, porque logo eu tenho que fazer isso? Esse tipo de gente que fica esperando meu sorriso se desmanchar para começar a falar que eu virei a senhora-do-mal-humor não merece o meu respeito, não mesmo. Desculpa aí se o melhor dia da tua vida não é o meu, mas eu não preciso adaptar o meu humor a você que fica me julgando. Ninguém vai querer que eu fique dizendo "você está muito chato hoje" quando não estiver em um dia bom, quando os acontecimentos não te deixam sorrir.

A minha cara feia para o mundo tá te incomodando hoje? Some de perto, é simples. Sobrou pra você que não tem nada a ver com o que me aconteceu para estar de mal humor só porque você mandou eu melhorar a cara? Bem feito! Vou fazer a mesma coisa se você tentar mais uma vez. Não é só porque eu te digo "bom dia" todos os dias que os meus dias são sempre bons. Oi, eu sou humana, tenho sentimento e as vezes eles não estão de bem comigo. Oi, eu sou mulher, tenho paixão por sapatos, TPM, pavor a homens metidos e dias ruins também. Assim, como você.

Meu humor não é sempre ácido assim, eu não sou sempre triste assim, já disse isso. Sou até doce, bem doce. É só respeitar o meu espaço, é só esperar meu sorriso voltar. Ora, ele sempre volta, tira um dia para não aparecer, mas volta. Espera só um pouquinho e vai ver que eu não sou tão má quanto pareço, que meu rosto fica iluminado quando sorrio. Eu sei que fica. Espera só um pouquinho e aí você pode me encher com qualquer assunto, qualquer bobagem, qualquer história, mas só depois. Agora, enquanto eu to quieta no meu canto, me deixa assim. Se eu sinto raiva ou tristeza não importa, só me deixa quieta. É melhor para você que não vai ganhar um toco de presente. É melhor para mim que não vou ser incomodada. 

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Aquelas coisas que a gente espera



É inevitável, mas bem ou mal a gente sempre acaba esperando algo dos outros. Nem que seja um obrigado. Talvez a vida fosse bem mais simples, lágrimas fossem evitadas e corações fossem poupados se a gente simplesmente não esperasse nada. Mas a gente espera. Espera sempre. Espera pouco. Espera médio. Espera muito. O fato é que a gente espera alguma atitude, algum gesto, nem que seja abanar lá de longe, fazer um sinal de positivo com a cabeça, um sorriso com o olhar, alguma coisa (por menor que seja).


A falta de educação das pessoas é impressionante. Não sabem agradecer, jogam bituca de cigarro no chão, cospem chiclete no meio da rua, não limpam o cocô do cachorro, não se importam com o outro. Por favor, se importe com você. É bonito, é legal, é saudável. Mas se importe com o outro, com os outros, com o que você faz diariamente. Deite a cabeça no travesseiro tendo a certeza de que fez o melhor que podia naquele dia.


Não quero jogar no seu colo um papinho autoajuda, muito menos te convencer de que estou certa. É claro que normalmente prefiro estar certa. Mas isso não vem ao caso. Todo mundo está esquecendo de ser gentil, de abrir a porta, de segurar o elevador, de retribuir um bom dia, de fazer uma gentileza assim, gratuita, bonita.


Vou dizer que espero. Espero um retorno, espero educação, espero boa vontade. Penso: se eu faço o outro também pode fazer. Queria não me estressar tanto, não sonhar demais, não ficar esperando coisas mágicas. Mas sou assim, toda intensa, toda esperançosa nessa humanidade carente de atenção, afeto, carente de olho no olho, de cafuné e de compreensão.


A gente deve fazer sem esperar algo em troca, eu sei, nos ensinam isso desde pequenos. Mas me choco com pequenas coisas do dia a dia. Toda vez que venho para a agência, por exemplo, me assusto. As pessoas abrem a porta e não seguram, pois pouco se importam se a porta vai parar no meio da sua cara. Você coloca o cartão na roleta, passa e quem está dentro do elevador ouve o barulho da roleta, ou seja, sabe que tem alguém passando e mesmo assim não segura o elevador. O que é isso? Pressa? Correria? Está atrasado? Não, é mal educado mesmo. O mundo não vai terminar se a pessoa esperar 30 segundos. Fico besta com isso. E quando seguro o elevador para alguém, o que acontece sempre, as pessoas me olham e dizem: nossa, obrigada, aqui todo mundo entra e não espera o outro, né? É. E isso tá errado. Completamente errado.


A cada dia que passa eu observo com surpresa que os valores estão invertidos. Crianças se tornando adultas cada vez mais cedo, pessoas cada vez mais rancorosas, o mundo virando do avesso, ninguém se importa com nada, a não ser com o próprio umbigo. Isso me entristece e assusta. Por isso, vez ou outra perco a fé no ser humano. Mas aí vem um dia depois do outro e tento ver as coisas com um pouco mais de esperança, afinal, é o que resta para todos nós.

Clarissa Corrêa


"Seu andar inclinado para a frente, o modo como ficava numa perna só enquanto escovava os dentes, o modo como ele batia o pé ao escutar 'Brown Sugar', o modo como segurava meu rosto com as duas mãos e me beijava. Eu queria construí-lo dentro de mim para jamais esquece-lo."

Elissa Schappell in Use-me

quarta-feira, 18 de maio de 2011


O que seria mais comum naquele lugar do que vê-los juntos? Nada. Eram amigos, sempre conversavam, mas naquele dia tudo estava diferente de amizade.
 Ele a viu de longe e quando chegou perto a chamou de sua. Ela nunca percebera isso, nunca quis ver que isso podia mesmo existir: ser de alguém. Ele estava vestindo seu sorriso mais bonito, ela tinha os olhos brilhando, mas nenhum dos dois tomou consciência disso, para eles era imperceptível.. mas só pra eles.
 Todo mundo em volta reparou, como se nunca estivessem visto-os juntos, como se aquele cena fosse bastante incomum. Perceberam o quanto eles se pertenciam, se completavam, que não pareciam fazer o tipo um do outro e acabavam por ser o tipo ideal do outro. Todos acharam que ela tinha opções de cara melhores, que ele podia ter garotas mais bonitas, mas ninguém discordou que naquele momento nenhuma outra pessoa estaria bem colocada naquela cena além deles. 
 Um dia eles vão enxergar que realmente se pertencem, todos já enxergaram e dizem isso. Enquanto eles não enxergam seguem assim, completamente seus, completamente cegos, juntos.

O amor é poá




É impressionante: antes de amar temos a mania de idealizar o amor. Depois que conhecemos o amor as verdades aparecem, os castelos desmoronam, surgem novas construções. Insisto: amar se aprende amando. Construímos muitos sonhos, mas é no dia a dia que o amor se esconde. E se mostra. E renasce. E se renova.

Na teoria tudo é magia. Na prática, as cores se misturam. O amor é uma tela branca, vazia. Cada um coloca sua cor, seu jeito de pintar, seu tom. O amor é uma melodia. O amor é tanta coisa bonita. E incompleta.

Para mim, o amor é poá. Tenho certeza que você sabe o que é poá. Escolha uma cor. Lilás, pode ser? Então, o fundo é lilás e as bolinhas são brancas. Poá, lilás e branco. Que bonito, que delicado. O amor é o fundo, o lilás. Cada bolinha é uma palavra: convivência, companheirismo, afeto, delicadeza, respeito, paciência, admiração, carinho, tesão, intimidade, amizade, lealdade, sinceridade, fidelidade, e por aí vai. Cada um tem o seu amor, sua forma de amar, seu amor poá.

Eu sou tarada por poá branco e preto. Fundo preto, bolinhas brancas. Cada bolinha é um elemento, um tempero, uma parte do conjunto, uma peça, um passo, uma evolução, um aprendizado. Cada bolinha é um símbolo. Cada símbolo é uma conquista. Cada conquista é suada, batalhada. Porque o amor é não querer desistir, pelo contrário, é resistir, não arredar o pé, querer ficar, querer tentar. O amor é uma eterna tentativa. É a busca por mais uma bolinha. É querer preencher os espaços, o vazio, o fundo de uma só cor. O amor é poá. E a gente completa ele do jeito que quiser.

Clarissa Corrêa

segunda-feira, 16 de maio de 2011




Por favor, não me analise
Não fique procurando
cada ponto fraco meu
Se ninguém resiste a uma análise
profunda, quanto mais eu!
Ciumenta, exigente, insegura, carente
toda cheia de marcas que a vida deixou:
Veja em cada exigência
um grito de carência,
um pedido de amor!

Amor, amor é síntese,
uma integração de dados:
não há que tirar nem pôr.
Não me corte em fatias,
(ninguém abraça um pedaço),
me envolva todo em seus braços
E eu serei perfeita, amor!

Do livro "Bom dia amor!", 1990

Mirthes Mathias

Evoluída

        

         Ele que não me lance um olhar de eu-estou-em-um-patamar-mais-alto-que-o-seu só porque  está com aquela gostosuda aí do lado dele e ela enche o facebook de declarações . Eu o amei mais do que ela ama, mas isso foi no passado. Evoluí. Mudei meu roteiro de viagem e o corte do cabelo. Continuo não sendo simpática e mesmo assim agora eu sou convidada para todas as festas que ele não vai - e elas são bastante divertidas. Não me lembro mais qual e sobre o que falava aquela música do nosso primeiro encontro, mas várias outras músicas me lembram várias outras pessoas e daí eu começo a sorrir sozinha... êta que vida boa!
          Me dei conta da quantidade de pessoas que estavam sentindo a minha falta, e depois de duas semanas em casa - roendo - estou ótima. Desde que essas duas semanas passaram estou cada vez melhor. Nem me lembro mais tanto dele, só quando vejo algo do tipo "chorei, bebi, chorei, bebi, bebi e chorei", só quando a conversa entre as amigas é sobre ex, só quando alguém menciona a pessoa que eu gostava. Mas tudo isso é coisa de momento, é mais emocionante falar daquele carinha que me ligou ontem.
          Ele pode até pensar que tá melhor que eu, mas eu sou menos antipática, mais estudada, mais popular, tenho uma reputação melhor do que a gostosuda dele. Posso até estar no nível de bonita e não de gostosuda, mas com certeza isso não me afeta, ela não me afeta, nem as (in)diretas do facebook me afetam. To evoluída.

terça-feira, 10 de maio de 2011

Ninguém



Sapato baixo, calça larga e cabelo preso. Esquentou e seus ombros tensos agradecem. Que cara bonita é essa? Já logo no elevador. Ah, devo ter dormido bem. Bom dia, bom dia. Olha, você está muito bonita hoje. Um fala, outro concorda. E pelos corredores, sorrisos dão continuidade aos elogios. O que é? Que segredo ela guarda? Que novidade é essa? Na cozinha perguntam: novo amor? No estacionamento perguntam: voltou com alguém? No restaurante, na hora do almoço: é alguém novo? Cruza com um namorado antigo "nossa, você tá muito... é o quê? Sexo? A noite toda? Conta, vai, eu agüento ouvir". Contar o quê? No espelho, enquanto escova os dentes, fecha os olhos e sabe pra si o segredo: ninguém. Não gostar de ninguém. Nada. Nem um restinho de nada. Nem de tudo que acabou e nem de nada que possa começar. Nada. Pouco importa qualquer outra vida do mundo. Não é nem pouco, é nada mesmo. Um dia inteiro para achar gostosas coisas bobas como um pacote de pipoca doce, um tênis pink ou a hora do banho quente com músicas recém baixadas e o tapetinho vermelho. Um dia inteiro sem escravidão. O celular, o e-mail, o telefone de casa, o ar, o interfone, a rua. São o que são e não carrascos que nada dizem e nada trazem. Um coração calmo, se ocupando de mandar sangue para as horas felizes de trabalho, estudo, yoga, massagem, dormir, bobeiras, pilates, comer, rir, cabelo, filmes, comprar, trabalhar mais, ler, amigos . É isso. Uma agenda enorme que a ocupa de ser ela e não sobra uma linha de dia pra lamentar existências alheias. Linda, ela segue. Linda e feliz como nunca. O segredo do espelho, escovando os dentes, sozinha, aperta os olhos, segura a alma um pouco sem respirar. Segura a pasta pensando que é um pouco de alma consistente na boca. Não cospe, suporte. Ela pode finalmente suportar seu peso e não dividir isso nem com o ventinho que entra pela janela. Nem com o ralo que a espera boquiaberto. A sensação é a da manhã seguinte que o papai Noel deixava os presentes: não é mentira, é só um jeito de contar a verdade com algum encantamento.

Tati Bernardi

O amor



Semana passada liguei pro meu melhor amigo e convidei para um cinema. A gente não se falava desde o ano novo, quando tudo deu errado pro nosso lado. De tempos em tempos sumimos, falamos umas coisas horríveis de quem se conhece demais. Ele topou desde que fosse daqui pra frente, preguiça de conversar da briga e tal. E fomos. Cheguei antes, comprei. Ele chegou depois, comprou água. Porque eu comprei os ingressos, ele comprou também uns doces e disse que pagaria o estacionamento. Porque ele pagaria o estacionamento, eu disse que daria a carona da volta. E com meu coração tão calmo eu voltei a sentir o soninho de sofá de casa com manta que sinto ao lado dele. A gente não se beija nem nada, mas quando vai ver pegou na mão um do outro de tanto que se gosta e se cuida e se sabe. Já tivemos nossos tempos de transar e passar nervoso e aquela coisa toda de quem ama prematuramente. Mas evoluímos para esse amor que nem sei explicar. Ele me conta das meninas, eu conto dos caras. Eu acho engraçado quando ele fala "ah, enjoei, ela era meio sem assunto" e olha pra mim com saudade. Ele também ri quando eu digo "ah, ele não entendeu nada" e olho pra ele sabendo que ele também não entende, mas pelo menos não vai embora. Ou vai mas sempre volta. Não temos ciúmes e nem posse porque somos pra sempre. Ainda que ele case, more na Bósnia, são quase quinze anos. Somos pra sempre. Ele conta do filme que tá fazendo, eu do livro. Os mesmos há mil anos. Contar é sem pressa de acabar. Se ele me corta é como se a frase que eu fosse falar fosse mesmo dele. É um exibicionismo orgânico, como se meu silêncio pudesse continuar me vendendo como uma boa pessoa. São quinze anos. É isso. Ele me viu de cabelo amarelo enrolado. Eu lembro dele gordinho e mais baixo. Ele sempre comprou meus testes de gravidez, mesmo a suspeita nunca sendo nossa. Eu já fui bem bonita numa festa só porque ele queria me fazer de namorada peituda pra provocar a ex mulher. Minha maior tristeza é que todo novo amor que eu arrumo vem sempre com algum velho amor tão longo e bonito. E eu sofro porque com pouco tempo não consigo ser melhor que o muito tempo. E de sofrer assim e enlouquecer assim, nunca dou tempo de ser muito para esses amores porque estrago antes. Mas meu melhor amigo é meu único amor. O único que consegui. Porque ele sempre volta. E meu coração fica calmo. E ele vai comigo na pizzaria e todos meus amigos novos morrem de rir porque ele é naturalmente engraçado e gente boa e sabe todos os assuntos do mundo. E todo mundo adora meu melhor amigo. E eu amo ele. E sempre acabamos suspirando aliviados "alguém é bobo como eu, alguém tem esse humor" e mais uma vez rimos da piada que inventamos, do pai que chega pro filho e fala: sua mãe não é sua mãe, eu transei com outra". E esse é meu presente dessa fase tão terrível de gente indo embora. Quem tem que ficar, fica.

Tati Bernardi

domingo, 8 de maio de 2011



"Tive medo da sua pressa, que sempre me ofende tanto. Tive medo da sua fidelidade. Você sempre foi muito bom, mas dificilmente me emprestou seu ombro, seu colo, sua mão, seu olhar carinhoso, seu suspiro, seu sono, sua fragilidade. Tive medo de ser só desejo, porque para mim sempre foi mais."

Tati Bernardi.


“Vou ser feliz, sem me importar com o que isso irá causar aos outros… o importante é que não estou fazendo mal a ninguém, pelo contrário! Estou apenas enterrando as impurezas e toxinas da minha vida e deixando brotar uma bela e frutífera árvore”

Caio Fernando Abreu

Não sou a filha perfeita, nunca fui. Tirei sempre boas notas, não sei mentir, ajudo no que posso para melhorar a convivência, não ultrapasso o horário de chegar em casa. Digo todos os dias que a amo e ela sabe que é sincero. Mas eu já discuti com professor, matei aula, já cheguei bêbada em casa, xinguei na frente dela, fiz pirraça. Ainda assim nunca ouvi minha mãe dizer que queria que eu fosse igual à filha do vizinho, ela sempre foi a maior defensora do que sou, de quem sou. Sei que Deus não poderia ter me dado uma mãe melhor do que a minha mama.

sábado, 7 de maio de 2011

Por favor, diferente.


Eu não espero que você seja o-grande-amor-da-minha-vida, parei de acreditar nisso... Não quero que você me faça chorar. Não quero que você seja um motivo ruim na minha vida. Você é motivo de sorrisos, razão pra eu acordar num dia de chuva e tomar banho e mudar de roupa porque eu sei que você vai passar aqui... Não quero te odiar. Não quero falar mal de você pros outros. Pras minhas amigas. Quero falar mal de você como quem ama. Pois é, Carla, ele nunca lembra de desligar o celular antes de dormir e sempre alguém do trabalho liga. Sabe, eu quero dizer isso. Que o máximo de irritação que você me provoca é me acordar de manhã cedo falando bobagens que parecem ser importantes no celular. Não quero que você me largue. Não quero te largar. Não quero ter motivos pra ir embora, pra te deixar falando sozinho, pra bater o telefone na sua cara. E eu não tenho medo que isso aconteça (eu nunca tenho), eu fiz isso com todos os outros. É só que dessa vez eu queria muito que fosse diferente. Dessa vez, com você, eu queria que desse certo. Que eu não te largasse no altar. Que eu não te visse com outra. Que eu não tivesse raiva. Que você não passasse a comer de boca aberta. Que você entendesse o meu problema com chãos de banheiro molhados pra sempre. Que você gostasse e cuidasse de mim como disse ontem à noite que cuidará. Eu quero que dê certo, não estraga, por favor. Não estraga não estraga não estraga. Posso pôr um post-it na sua carteira? Mesmo que a gente não fique juntos pra sempre. Mesmo que acabe semana que vem. Nunca destrua o meu carinho por você. Nunca esfrie o calorzinho que aparece dentro de mim quando você liga, sorri ou aparece... Mesmo que você apareça na porta de outras mulheres depois de me deixar. Me deixe um dia, se quiser. Mas me deixe te amando. É só o que eu peço.
(Tati Bernardi)




Eu não queria sofrer por antecipação e, menos ainda, me sentir emocionalmente burra e tão vulnerável aos meus próprios caprichos bobos. Queria que ele não tivesse cabelo liso e que não tivesse conseguido implantar em você a sementinha do amorzinho perfeito, que não existe, mas que a gente cisma em acreditar( ainda mais quando há um continente e muitas expectativas de distância entre as pessoas). Queria que fosse mais fácil não pensar nos "talvez" e continuar vivendo o momento com o gozo à flor da pele e as emoções maquiadas pra caralho, como foi até agora.

Ah, e à propósito não, eu não estou, ainda, apaixonada por você.


Rani Ghazzaoui



"Todos os amores são conchas vazias, todos os corações um dia são partidos. Mas quando a gente encontra alguém pra deitar do nosso lado e contar estrelas com a gente, é como se uma pérola só nossa brotasse dentro da concha e fizesse a gente esquecer o escuro e a solidão. Eu sei que você tem medo e eu também tenho, mas a vida veio pra ser vivida e, se um dia roubarem a sua pérola tenha apenas uma certeza: você não vai morrer e quando menos esperar outra pérola nasce. O nosso amor é burro, mas é bom. Quem escolhe se esconder dele por segurança não se machuca, é fato, mas também nunca conta estrelas de madrugada e nem, no final da vida, tem um colar de lembranças para contar."

Rani Ghazzaoui

sexta-feira, 6 de maio de 2011



"Porque eu tenho pesadelos que parecem tão reais até quando você me abraça. E eu acordo triste, e brigo de verdade e passo o dia grave e dolorida como quando a gente leva um tombo no piso liso... que é só o passado. É como se eu sentisse um ciúme horroroso do meu livro predileto comprado em sebo, a dedicatória apaixonada que não é a minha, os resquícios do manuseio de outras mãos. Alguém corrompeu o trecho que eu mais gostava quando grifou à caneta algo que não pude apagar com borracha e que era tão secretamente meu. Desenhou corações onde só havia minha dor e eu discordei da interpretação alheia. E achei aquilo tudo de uma crueldade atroz. Mas permaneci com o livro no colo, cheia de um afeto confuso por ele: afeto pelo que era, angústia por já ter sido de outro alguém, e aquela sensação (imbecil) de falta de exclusividade. Eu que sempre achei que tudo é e está para o mundo. Perdoa o meu senso de autoimportância, já que não consigo perdoar o meu egoísmo. Eu sei que em alguns presentes, no embrulho, laços do passado são aproveitados. Eu só queria que eles não fossem tão vermelhos: desses que doem nos olhos e no coração."

Marla de Queiroz


Havia a levíssima embriaguez de andarem juntos, a alegria como quando se sente a garganta um pouco seca e se vê que por admiração se estava de boca entreaberta: eles respiravam de antemão o ar que estava à frente, e ter esta sede era a própria água deles.

Andavam por ruas e ruas falando e rindo, falavam e riam para dar matéria peso à levíssima embriaguez que era a alegria da sede deles.
Por causa de carros e pessoas, às vezes eles se tocavam, e ao toque - a sede é a graça, mas as águas são uma beleza de escuras - e ao toque brilhava o brilho da água deles, a boca ficando um pouco mais seca de admiração.
Como eles admiravam estarem juntos!
Até que tudo se transformou em não. Tudo se transformou em não quando eles quiseram essa mesma alegria deles. Então a grande dança dos erros. O cerimonial das palavras desacertadas. Ele procurava e não via, ela não via que ele não vira, ela que, estava ali, no entanto. No entanto ele que estava ali. Tudo errou, e havia a grande poeira das ruas, e quanto mais erravam, mais com aspereza queriam, sem um sorriso. Tudo só porque tinham prestado atenção, só porque não estavam bastante distraídos. Só porque, de súbito exigentes e duros, quiseram ter o que já tinham. Tudo porque quiseram dar um nome; porque quiseram ser, eles que eram. Foram então aprender que, não se estando distraído, o telefone não toca, e é preciso sair de casa para que a carta chegue, e quando o telefone finalmente toca, o deserto da espera já cortou os fios. Tudo, tudo por não estarem mais distraídos.

Clarice Lispector

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Afinal é lindo



        O que eu fiz pelo meu último amor? Eu menti para poder encontrá-lo, perdoei as traições, deixei de dar ouvidos às pessoas que gritavam a verdade na minha frente, deixei de falar pelas entrelinhas e escancarei que o amava. Saí escondida, usei o perfume que ele gostava, soltei o cabelo, cheguei de surpresa, fiz verdades de coisas que eu mesma sabia que eram mentiras. Fui tão boba quanto consegui, decidi que não queria mais, voltei atrás, fiz besteiras incontáveis.
          Eu mergulhei naquela fossa interior que só quem passou por uma sabe quando vi que não havia mais nada entre nós. Bebi, eu bebi pensando nele. Chorei, rabisquei um caderno todo por causa dele, achei a melhor festa do ano horrível só porque achava que ele estava com raiva de mim. Deixei passar os melhores caras que me quiseram porque não achava que ele merecia que eu ficasse com mais ninguém, mesmo sabendo que ele ficava com outras. Me arrependi cada vez que beijei outro cara porque no fim eu sempre chegava em casa e me lembrava dele.  
          Hoje é claro que ele não está comigo, mas eu não me arrependo de nada que fiz. Fui tão tola quanto alguma pessoa pode ser só para estar com ele. E que me atire a primeira pedra quem nunca fez besteira quando está apaixonado.
          Hoje eu vejo o quanto foi ridículo, como eu acreditei em mentiras, como as pessoas que me alertaram estavam certas: ele nunca foi o cara certo pra mim. Hoje eu sei o quanto me doeu me manter em uma história que nunca foi verdadeiramente um romance, hoje, hoje, hoje... eu não sabia de nada disso quando entrei nessa história.
          Não me arrependo de ter feito isso, na verdade eu sei que posso vir a ser a garota boba novamente (será que eu deixei de ser?). Bem, algumas coisas com certeza serão diferentes: eu não farei nada disso novamente pela mesma pessoa e provavelmente não vou mais me entregar de uma vez. Eu ainda vou amar mais e mais vezes. E vou quebrar a cara, e vou decepcionar alguns, e vou roer, e vou me sentir a pessoa mais amada do mundo, e vou me sentir a pessoa mais enganada do mundo também, e vou perdoar mais vezes, e beber mais vezes por amor bandido, e vou ter preguiça de discussões, e vou ser boba muitas outras vezes.
          Mas essa que é a parte boa, eu vou amar e isso é lindo. Ainda tem um coração aqui dentro de mim e, apesar do coitadinho ter apanhado e perdido um pedacinho dele, ainda existe toda a disposição vinda dele para amar de novo. Não importa que depois eu vá achar ridículo tudo o que eu fiz quando apaixonada,vai ser lindo na hora. Se dói só é na hora do deixar de amar e toda dor passa, mesmo que demore passa (e eu sei que às vezes demora mesmo) e aí aparecem outros amores. E o que é a vida sem amar?

terça-feira, 3 de maio de 2011




"Não se puna. Não finja que-os-problemas-foram-superados-e-tudo-está-num-ótimo-astral.
Chama uma Ro-Ro, vira a mesa de vez e parte pra outra.
Você, como qualquer ser humano, precisa de amor —
e como ser humano legal e especialíssimo, merece amor de uma pessoa bonita."

Caio Fernando Abreu.

segunda-feira, 2 de maio de 2011


Ela não precisa ser a mulher perfeita: não precisa usar sutiã 44, calça 36, não ter nenhuma celulite, ter  o cabelo claro com cachos bem feitos até a cintura. Ela não precisa ser a garotinha popular, não precisa dançar divinamente. Basta que seu sorriso seja sincero, que suas palavras sejam doces, que não seja vulgar, que seja decidida, que ela seja verdadeira, que preze os amigos, que não tenha vergonha de chorar, mas não viva de fazer drama. Basta que ela goste dele e que, principalmente, deixe bem claro que vai sobreviver se ele um dia a deixar. Pronto, ela acabou de apaixonar o cara.



“Você me ensinou muita coisa, a te respeitar, te admirar, te querer, só não me ensinou a te amar, isso aprendi sozinha. Sabe, quando estamos distantes, mesmo que por horas, sinto muita saudade… a vida fica surda sem você, porque o volume do mundo abaixa para ouvir meu grito interno. Às vezes sinto que você vai me querer pra sempre, e vai assumir tudo isso e ficar ao meu lado pra sempre. Porque eu ainda sou frágil, preciso de você, preciso que cuide de mim. Mas não quero sujar nosso amor com a minha mania de amar despedaçada e esfarelada, quero ficar toda inteira pra quando você me quiser.”

Tati Bernardi.

domingo, 1 de maio de 2011




“Porque você não faz parte da minha vida e eu não me importo mais com isso, já tinha me curado do vício de falar sobre você e de pensar em você. Mas depois que sonhei com você, sonho esse que estou quase me convencendo que foi o meu subconsciente, me dizendo que eu não me curei porra nenhuma e que eu amo você de uma maneira incrível e contraditória.”

Tati Bernardi.


“Chora não, menina boba. Era só um garotinho igual aos 345 que têm nas lojas. Que modelo você quer agora? Quer o modelo que fala irado, o que fala maior vibe ou o que fala insano? Ah, mãe, queria um que falasse coisas mais inteligentes e profundas, tem desse? Tem, mas custa um pouco mais caro porque é importado de outro planeta. Nada que dez vezes no cartão não resolva.”


Tati Bernardi

A despedida do amor


   Existem duas dores de amor:
   A primeira é quando a relação termina e a gente, seguindo amando, tem que se acostumar com a ausência do outro, com a sensação de perda, de rejeição e com a falta de perspectiva, já que ainda estamos tão embrulhados na dor que não conseguimos ver luz no fim do túnel.
   A segunda dor é quando começamos a vislumbrar a luz no fim do túnel.
   A mais dilacerante é a dor física da falta de beijos e abraços, a dor de virar desimportante para o ser amado. Mas, quando esta dor passa, começamos um outro ritual de despedida: a dor de abandonar o amor que sentíamos. A dor de esvaziar o coração, de remover a saudade, de ficar livre, sem sentimento especial por aquela pessoa. Dói também...
   Na verdade, ficamos apegados ao amor tanto quanto à pessoa que o gerou. Muitas pessoas reclamam por não conseguir se desprender de alguém. É que, sem se darem conta, não querem se desprender. Aquele amor, mesmo não retribuído, tornou-se um souvenir, lembrança de uma época bonita que foi vivida... Passou a ser um bem de valor inestimável, é uma sensação à qual a gente se apega. Faz parte de nós. Queremos, lógicamente, voltar a ser alegres e disponíveis, mas para isso é preciso abrir mão de algo que nos foi caro por muito tempo, que de certa maneira entranhou-se na gente, e que só com muito esforço é possível alforriar.
   É uma dor mais amena, quase imperceptível. Talvez, por isso, costuma durar mais do que a "dor-de-cotovelo" propriamente dita. É uma dor que nos confunde. Parece ser aquela mesma dor primeira, mas já é outra. A pessoa que nos deixou já não nos interessa mais, mas interessa o amor que sentíamos por ela, aquele amor que nos justificava como seres humanos, que nos colocava dentro das estatísticas: "Eu amo, logo existo".
   Despedir-se de um amor é despedir-se de si mesmo. É o arremate de uma história que terminou, externamente, sem nossa concordância, mas que precisa também sair de dentro da gente...
   E só então a gente poderá amar, de novo.

(Martha Medeiros)



"Deus, põe teus olhos amorosos sobre todos que já tiveram um amor e de alguma forma insana esperam a volta dele: que os telefones toquem que as cartas finalmente cheguem... Amém!"


Caio Fernado Abreu


"Eu me lembro de uma manhã acordando bem cedo.
Havia um sentimento de possibilidade. Sabe? Esse sentimento? E me lembro de pensar comigo mesma: "Então, é assim que começa a felicidade. Aqui é o começo. E, é claro, haverá sempre mais". Nunca me ocorreu que não era o começo. Já era felicidade.
Era o momento... bem ali."


(As Horas)